sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A vida da Saudade


A Saudade quando desperta, se levanta da alma e toma banho de lágrimas.

Ergue os olhos inundados de aurora e sorri diante da estrada despejada aos seus pés.
Toma um gole de esperança, saboreia quimeras de fé.
Então, apanha um casaco de paciência. 
O frio percorre o vazio deixado ao abrir a porta.
Saudade não se despede da Solidão. Deixa-a entregue aos monólogos em que dorme.
É primavera e há flores ao longo da estrada.
O orvalho refresca os passos rumo ao seu destino.
Saudade sabe que sua natureza é morrer.
Deve morrer para dar vida e renascer quando a distância brotar das mãos de quem se vai.

Morrerá quantas vezes forem necessárias.
Morrerá na paz do reencontro.
Morrerá no calor de um abraço.
Morrerá na doçura de lábios se tocando.
Morrerá nas memórias revividas e reinventadas.
Morrerá na sina de sua própria ressurreição.

Ressurge das plataformas de embarque.
Ressurge da melancolia do adeus.
Ressurge das mãos que se soltam.
Ressurge do rompimento de laços.
Ressurge das cinzas da morte.
Ressurge da sina de sua própria necessidade de morrer.

(Sayaka Maruyama)



Beatriz já lê

Eu acredito e incentivo a leitura a partir do primeiro ano de vida...

Acho que as palavras podem ceder espaço para a imagem. Vale a pena assistir:


http://www.youtube.com/watch?v=M9v_5HxjBIA





terça-feira, 29 de outubro de 2013

Bem aventurados os que leem!

http://belavistanews.wordpress.com/tag/filme/


Sempre que assisto ao filme "O livro de Eli" consolido minhas convicções sobre o poder conferido a quem tem acesso ao conhecimento. No entanto, não se trata de qualquer tipo de acesso, pois existem várias maneiras de construirmos conhecimentos e checarmos a eficácia de nossas hipóteses; há vários caminhos para conseguirmos informações. O tipo de acesso comunicado neste filme é a leitura. Mais precisamente a leitura de um determinado livro.
http://fimdomundo.me/2012/12/13/o-livro-de-eli-o-livro-de-poder/
Carnegie, líder perverso e ambicioso de seu vilarejo, devastado pela guerra empunhada pelo poderio humano, vivido pelo ator Gary Oldman, tem a ideia fixa (e ele está certo a meu ver) de que seu domínio será irrestrito e intransferível quando colocar as mãos e ter sob sua custódia um certo livro, cujas histórias convencerão seus súditos de que ele (Carnegie) tem as respostas para seus dramas, para a sombra em que vivem. Carnegie vê neste livro a possibilidade de acessar informações que possam seduzir a comunidade que lidera a segui-lo cega e silenciosamente.
Alguns detalhes da obra corroboram para fortalecer o plano de Carnegie: somente o ditador sabe ler. Resultado: ainda que saibam do livro, os pobre servos não traduzirão o emaranhado de palavras ali presentes. Terão de confiar no "Mestre".
Era exatamente neste ponto onde eu queria chegar.
Há todo um discurso pronto na sociedade de que ler é importante e fundamental. Campanhas publicitárias invadem rádio, televisão e revistas conclamando a todos para que leiam. A escola faz deste objeto de ensino, a leitura, sua razão de existir.
No entanto pouco se fala da ascensão ao poder quando sabemos ler. Para além da possibilidade de viajar sem sair do lugar, de dar asas à imaginação, ler ingressa o leitor à sociedade do conhecimento e da informação. Muito mais que dar respostas, ler impele a fazer perguntas, a questionar as tantas verdades que um dia alguém "mais sabido" nos impôs.
Quando falo "ler", ultrapasso as cercas da decifração, estratégia indispensável no ato da leitura. Falo do mergulho investigativo que estabelece relações com outros textos e outras experiências (sim, experiências são preciosas no processo de construção de sentidos) e emerge reticências para novas combinações e significados. Falo da leitura que revela o dito e o não dito. Falo da leitura que provoca a busca por outras leituras, bem como pelo desejo de não ler.
http://pipocamoderna.com.br/o-livro-de-eli-leva-a-biblia-para-o-pos-apocalipse
Esse tipo de leitura permite ao leitor muito mais que o poder, mas a flexibilidade de ir e vir, de agregar e desconstruir, sem desfazer da versão que o outro traz, mas com a plena capacidade de compreendê-la e reeditá-la.
E salve o Dia do Livro Nacional (29/10) !!!!!

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

A pá lavra!

Já reparou como algumas palavras se comportam de acordo com o que significam?
Nunca havia pensado nisso antes, mas ao dizer SORRISO e sentir meus lábios se abrindo e os cantos da boca tomando distância de um lado a outro, percebi que a palavra SORRISO confere o riso aos lábios. Diga SORRISO em frente ao espelho. Se puder articule exageradamente os lábios. Você flagrará um sorriso de fato, natural, inclusive.
SINCERIDADE traz exatamente a leveza que sentimos aos sermos verdadeiros (ainda que doa no outro). Tirar dos ombros a carga do incômodo é um alívio, o que só possível com sinceridade. Dizer SINCERIDADE elimina tanto ar durante a pronúncia quanto dizer a verdade elimina o peso na consciência.
(Leslie Ann O'Dell)
TOLERÂNCIA parece um pêndulo. A língua sobe e desce num baile de atitude e espera. Pronunciar TOLERÂNCIA nos faz compreender o que é aceitar o tempo necessário para concluir a fala e o pensar. Ao findar a pronúncia da penúltima sílaba, já não temos mais o desejo de impor nossa vontade, sem antes conhecer o que vai no pensamento alheio.
LUZ te projeta  tal como a lâmpada que se acende e espalha luminosidade sobre o breu imperante. O prolongamento impresso aos lábios quando se fala LUZ revela a verdadeira dimensão desta fonte de energia quando necessitamos de força, coragem, proteção.
LIVRO liberta.
PARTO rompe.
PERFUME volatiza.
ESTRELA revela.
CHORO molha.
PIANO cala.
MANTEIGA escorrega.
SILÊNCIO sossega.
E assim, uma infinidade de proposições podem materializar o pensamento numa palavra que se diga.
E deve haver uma cumplicidade entre palavra e poeta. O poeta sabe exatamente que palavra escolher para seduzir o leitor a enxergar o que ele quer dizer.
Amo as palavras pela oportunidade que nos oferecem de brincar com os sentidos, de dar forma ao pensamento e, ao leitor, o direito de edificar o que melhor lhe servir.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

É preciso falar o que queremos dizer!

(Afshin Pirhashemi)
Comunicação é o que salva o ser humano do isolamento ao mesmo tempo em que pode afastar os falantes que ocupam um mesmo espaço. Se não cuidarmos de potencializar um diálogo construído sobre a trama da diversidade conceitual, que compõe as entidades pensantes, seremos fadados ao silêncio barulhento e massacrante daqueles que falam e não se fazem ouvir.
Arranjar as palavras para que deem corpo ao pensamento, num processo instantâneo e coletivo, pode conjugar dizeres agregadores que nos confraternizam numa mesma comunidade. Ou não, pode levar ao recrudescimento da arte de se comunicar, encaminhando para posições radicais, dicotomizando pareceres entre aqueles que, pela natureza do lugar que ocupam, precisam comungar das mesmas palavras, ainda que concepções díspares caracterizem seu fazer enquanto personagens históricos.
A mesma frase que edifica uma proposta, tende a demolir estruturas construídas em bases pouco consistentes, fruto de um emaranhando de palavras divergentes emitidas por um time que acredita investir em ações que levam a bola a balançar a rede do gol.
Comunicar implica escolhas delicadas. Escolhas não só de palavras, mas de combinações e instrumentos. Escolhas que podem criar ou desconstruir.
Que a escolha não seja por descuido, mas por uma decisão emergente, cuja seta indicadora nos leve ao cerne do que queremos conquistar, seja isto, criar, recriar, até mesmo desconstruir. 
Que a escolha não seja inocente, mas prudente. Que provoque quem houve e lê a tirar suas próprias conclusões, mas que entenda onde o escritor ou falante desejou alcançar.
Que escolha nos convoque ao dialogismo produtivo, apagando o palavrório paralisador que ocupa nosso tempo precioso quando temos de discursar expressões do tipo "não foi bem isso que eu quis dizer", "você está colocando palavras na minha boca" ou "foi isso que eu disse, só que com outras palavras".
Já dizia o Velho Guerreiro: "quem não se comunica se estrumbica" e de "estrumbicação" estamos fartos!